A situação das vítimas das enchentes está cada vez mais crítica. Falta tudo: água potável, local para dormir e comida.
“Eu não sei, infelizmente”. A resposta com olhar cabisbaixo sobre “o dia de amanhã” é de um desabrigado, desempregado, com filhos para criar e a incerteza de até quando a chuva vai castigar e, com isso, continuará a receber os mantimentos de refugiado da cheia. O olhar desolador é de Carlos Alberto da Silva, de Limoeiro do Norte, mas pode ser encontrado em milhares de outras vítimas das enchentes no Ceará. Apesar do fornecimento de cestas básicas, em várias cidades, como Jaguaruana, o apelo de hoje ainda é por comida, por água, e em breve — quando muitos não terão mais as casas para onde retornar — será por dignidade.
Nos abrigos, um dos maiores problemas é a falta de comida.
Chuvas, águas, cheias, rios, casas, destruição e lágrimas, abrigos. E depois disso? Há mais de 20 dias dos primeiros desabrigados, e a ajuda ainda demora a chegar, e quando não aparece só prolonga o quadro de transtorno do cearense, que pede para chover sol, uma luz no fim das nuvens. Em Jaguaruana são 75 comunidades atingidas pelas águas. A situação nos 22 abrigos “está melhorando, mas ainda tem pontos críticos, porque não está dando para atender a todo mundo”, afirma Luis Lopes, coordenador municipal da Defesa Civil. São 1.250 desabrigados, e a população ainda reclama que está com fome. A Defesa Civil do Estado doou 400 cestas básicas e 300 kits de abrigamento.
O município é o primeiro do Estado em número de desabrigados e desalojados – cinco mil pessoas – e o sexto em afetados diretamente pelas chuvas (11 mil pessoas), mas até ontem, ao contrário de municípios como Limoeiro e Itaiçaba, da mesma região e que receberam R$ 200 e R$ 300 mil, respectivamente, Jaguaruana não recebeu recurso financeiro. O prefeito Bebeto Delfino aguardava encontro com o governador Cid Gomes, em Palhano, onde foi inaugurada a reforma de uma rodovia estadual na manhã de ontem. Fez o apelo angustiado, assim como outros 56 prefeitos de cidades atingidas pelas chuvas no Ceará.
O efeito dominó na quadra chuvosa do Nordeste, ainda que com o surpreendente volume de águas, expõe um problema que não tem mais tapete para esconder: o Ceará não esteve preparado para o presente e o futuro “depois das águas” ainda é incerto para as famílias que tiveram as casas completamente destruídas ou ao menos comprometidas. “Nem eles sabem”, diz a desabrigada Maria de Fátima, referindo-se aos “senhores governantes”.
Rosineide Lopes, da Ilha de Santa Terezinha, chora, fica mais nervosa, tem a pressão arterial elevada: “tô passando mal”. Pudera, perdeu a casa, que já “não era lá essas coisas”, mas era o que tinha nesse mundo: dois ‘vãos’ de barro, rebocados com sua próprias mãos. Mas ainda tem aos filhos, “que é o mais importante”. Na mesma creche-abrigo, a adolescente Francisca Maisa, de 17 anos, está grávida do segundo filho. No mês passado fez uma cirurgia para retirar um coágulo sanguíneo na cabeça. “Ela não pode ter uma raiva, uma angústia que dá dor de cabeça e é perigoso”, avisa Rosineide, chorando ao ver Maisa chorar, porque motivos não faltam.
A escola, sempre anunciada como “a nossa segunda casa” hoje é a primeira e única na realidade da maioria dos desabrigados pelas chuvas. Nas paredes da Escola Ester Guimarães, em Limoeiro, frases de “Bom dia”, “Sejam Bem-Vindos”, as vogais e a afirmativa: “a educação constrói o mundo”. Mas tudo passa despercebido para quem teve a casa destruída, precisa fazer a comida para um batalhão de gente e ainda sofre a angústia da dúvida se toda a família está salva.
A Secretaria Municipal de Ação Social tem conseguido abastecer todos os abrigos. Um núcleo de apoio funciona 24 horas para atender as vítimas, “e o que está faltando a gente tem providenciado”, diz o secretário Pedro Luciano, que ouvirá a demanda da desabrigada Glauberlândia de Sousa por leite para o filho e mais um colchonete, “pois estão dormindo quatro pessoas num só”.
Para o fim de semana, a Funceme prevê chuva na metade sul do Ceará e, nas demais regiões, precipitação de forma isolada. Haverá nebulosidade variável, mas não está descartada a chuva no litoral.
Mais informações:
Defesa Civil de Limoeiro do Norte - (88) 3423.1340
Defesa Civil de Jaguaruana - (88) 3418.1288
Fonte: Diário do Nordeste / Reportagem e Foto: Melquíades Júnior
Um comentário:
Situação triste, e olha que as mudanças climáticas estão ocorrendo no mundo inteiro!!!Isso é apenas o começo de grandes transformações, o aquecimento global já mostra as consequências.
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