sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Agrotóxicos, o veneno nosso de cada dia

Por: Dr. Reuber Tadeu Vieira e Silva
“O médico empenhar-se-á em melhorar os padrões dos serviços médicos e em assumir sua responsabilidade em relação à saúde pública, à educação sanitária e à legislação referente à saúde”.
Código de Ética Médica, Artigo XIV.
Há alguns anos adquiri uma pequena propriedade na Chapada do Apodi. Ainda com um pouco de mata virgem, que preservo até hoje. Um lugar de muito silêncio, muito ventilado, que fui aos poucos me apaixonando. E, como bom interiorano, dedico uma parte do meu tempo às atividades bucólicas.
Hoje já sinto um pouco o reflexo daquilo que chamamos de desenvolvimento, de geração de emprego e renda. Empresas de grande porte, do agronegócio, se instalaram na chapada, com grandes produções de melão, abacaxi, mamão, banana, e outras. Passaram a utilizar agrotóxicos em grande quantidade, com grandes reflexos para a saúde do trabalhador, sendo grande o número deles intoxicados, fato que ocorre em todo o Brasil.
Pequenos produtores passaram a agir da mesma forma. Utilizando agrotóxicos sem orientação técnica, com práticas agrícolas incorretas e em desrespeito à legislação. Os trabalhadores com menos recursos financeiros, e menor nível de instrução, geralmente utilizam equipamentos de aplicação manual, pouco ou nenhum equipamento de proteção individual, e não realizam exames médicos periódicos. Há poucos dias, acordei já quase quatro horas da manhã, com o ronco do trator, em plantação de mamão e banana, a cento e cinqüenta metros da minha casa. Pois que as nossas propriedades são separadas por uma estrada estreita, que chamamos corredor. Abri a porta e constatei que realmente essa máquina jogava uma nuvem de veneno cobrindo toda a plantação.
Há alguns meses, um avião que é muito utilizado aqui na chapada para jogar agrotóxico nas bananeiras, fazia a volta passando por sobre a minha casa, numa bela manhã de domingo. Saí e protestei, sendo que o aviador fez um vôo rasante sobre a minha cabeça. Depois, foi embora, e de carro, veio ao meu encontro, pedir-me desculpas, pois tinha errado a propriedade onde deveria aplicar o veneno.
A ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) divulgou o resultado do monitoramento de agrotóxicos em alimentos em abril de 2008. O pimentão, o morango (um produtor de morangos, em São Paulo, perguntado se comeria os morangos da sua produção, respondeu que não teria coragem de comê-los), a uva, a cenoura e a alface foram os alimentos que apresentaram os maiores números de amostras irregulares referentes a resíduos de agrotóxicos. O agrotóxico movimentou sete bilhões de dólares no Brasil em 2008.
Em setembro, agora de 2009, a ANVISA recomendou o banimento em todo o país do ENDOSSULFAM, usado em culturas do algodão, cacau, café, cana-de-açúcar e soja, e do ACEFATO, usado nas culturas do amendoim, batata, brócolis, couve, citros, feijão, melão, pimentão, repolho e tomate. O ACEFATO só poderá ser usado em algodão e soja até 31/10/2013. Também, proíbe o uso do ACEFATO em jardinagem. Não poderá ser usada de forma manual ou costal (bomba nas costas).
O Brasil é atualmente o país que mais utiliza agrotóxicos em todo o mundo, assumindo essa posição a partir de 2008, quando superou os Estados Unidos. Ou seja, a parte da produção não agroecológica está sob influência de volumes enormes de defensivos químicos, muito além do que seria aceitável para que nossa alimentação diária não representasse uma ameaça à saúde.
O Brasil ainda permite, em sua agricultura, agrotóxicos que já são proibidos nas maiores economias do planeta que têm expressão agrícola. Usamos agrotóxicos que já são proibidos em toda a comunidade européia, nos Estados Unidos, no Canadá, no Japão, na China e na Índia. Permite porque as multinacionais têm poder desmedido sobre a agricultura brasileira, e por sua influência junto ao agronegócio. O próprio governo permite redução de impostos a essas empresas para que elas vendam mais, para que o agronegócio produza mais, e, conseqüentemente, que a população se contamine mais.
A Anvisa está tentando retirar do mercado Brasileiro 14 princípios ativos (substâncias) presentes em mais de 200 agrotóxicos. Mas a luta será árdua. Primeiro porque o registro de um agrotóxico no Brasil é eterno. Segundo, porque há apoio de setores políticos fortes, como a bancada ruralista, que exerce forte pressão, pela desregulamentação, com posições retrógradas como a de colocar a discussão sobre o uso dos agrotóxicos apenas sob a tutela do Ministério da Agricultura, deixando de fora o Meio Ambiente e a Anvisa.
Recentemente, a Anvisa definiu que até 2011 a cihexatina não deverá ser mais usada no Brasil, como já ocorreu nos Estados Unidos, Reino Unido, Japão, China e Áustria. A importação e o registro de novos produtos com a substância já estão proibidos. Ela é usada na produção de sete agrotóxicos, usados basicamente no cultivo de maçã, morango, pêssego, café e berinjela. Conforme a agência, ela pode causar má formação fetal, danos à pele, pulmões, visão, fígado e rins, além de risco de abortos e prejudicar o sistema reprodutivo.
O ENDOSSULFAN e o ACETATO, conforme estudos realizados, causam grandes danos à saúde. Problemas como neurotoxicidade, carcinogenese e toxicidade reprodutiva já estão documentados.
O ENDOSSULFAN está relacionado a doenças crônicas do sistema nervoso central (epilepsia e doença de Parkinson), a ações mutagênicas e genotóxicas e a alterações no sistema imunológico. A intoxicação aguda causa diarréia, enjôos, dor de cabeça, náuseas, chagas, dor de garganta e quadro clínico similar à asma.
Para reduzir o risco de contaminação por agrotóxicos potentes, como organofosforados e carbamatos, lave bem os alimentos em uma solução com uma colher de sopa de bicarbonato de sódio para cada litro de água. Isso elimina metade dos resíduos dessas substâncias. A medida não dispensa uma lavagem com vinagre e detergentes, que ajudam a eliminar outros microorganismos. As dicas são do médico e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Mauro Velho de Castro Faria.
Já a Anvisa avalia que, dependendo do nível de contaminação, pouco se pode fazer para driblar a ingestão de agrotóxicos. Para a agência, lavagens só adiantariam frente a bactérias. As recomendações oficiais incluem retirar folhas externas e cascas dos alimentos, consumir produtos da época e de produção local, variar a alimentação para evitar exposição a riscos constantes, consumir produtos sem venenos, como orgânicos ou agroecológicos.
Finalizando, e como conclusão, nós não podemos usar produtos que favoreçam o agronegócio em detrimento da saúde, uma vez que o uso desses produtos é responsável por forte incidência de câncer na nossa população, que precisa, portanto, ser protegida e informada. E, para quem mora na cidade, e dorme o sono dos anjos, é bom saber que o inseticida se degrada muito lentamente, permanece anos no meio ambiente, e se desloca a grandes distâncias pelas correntes de ar e de água.
Informações: TVJAGUAR.com.br (coluna Dia a Dia)
Fontes: Anvisa, O Eco, Jornais, Idec, Ecodebate

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