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segunda-feira, 5 de maio de 2008
Aumentam casos de câncer
A ingestão de alimentos com excesso de agrotóxicos pode causar, após anos de consumo, mudanças no metabolismo do organismo e no sistema nervoso, o que pode repercutir em doenças como hepatite e até câncer. Conforme os médicos, é difícil fazer a associação agrotóxico-câncer, já que algumas doenças estariam mais relacionadas a hipersensibilização de pessoas alérgicas.
No entanto, o contato, sob diversas formas, da população do Vale do Jaguaribe, especialmente Limoeiro do Norte e Quixeré, com agrotóxicos tem “coincidido” em mudanças no quadro clínico de muitas delas. No município de Limoeiro, o índice de mortalidade por neoplasias, o termo médico para câncer, está aumentando cerca de 10% ao ano.
De 2002, período da chegada de grandes empresas agrícolas à região jaguaribana, até o ano de 2006 morreram 781 pessoas nos municípios da 10ª Célula Regional de Saúde (Ceres), que compreende Alto Santo, Ererê, Iracema, Jaguaribara, Jaguaribe, Pereiro, Potiretama, Quixeré, São João do Jaguaribe, Tabuleiro do Norte e Limoeiro do Norte, sendo que este último lidera a lista de óbitos em todos os anos consultados pela reportagem.
Em 2002, o município registrou 37 óbitos por neoplasias, número que sobe para 56 no ano de 2006. As principais incidências de tumores se deram em fígado, estômago, pulmões, mama e próstata.
Registros
Os municípios com maiores registros são os mesmos que, há pouco mais de dois anos, foram citados em levantamento do Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador do Ceará (Cerest), sobre quantidade de internações por intoxicação no Estado do Ceará – de 639 em 2004 para 1.106 em 2005. Limoeiro do Norte liderava a lista.
Na época, a Secretaria de Saúde do Estado (Sesa) tentou amenizar o resultado, alegando que houve falha na digitação e supervalorização dos números de internações em algumas cidades, principalmente as de grande cultivo agrícola.
Curiosamente, o quadro de mortalidade por câncer na mesma região apresenta o mesmo ritmo de crescimento da morbidade, conforme verificado no ano de 2005.
A reportagem ouviu alguns médicos das redes pública e privada do município de Limoeiro do Norte. Nenhum quis gravar entrevista e também pediram para não ser identificados, no entanto disseram não ter dúvida que os agrotóxicos usados na região têm “alguma associação” ao quadro de doenças que vem crescendo no município. Entretanto, como não existe nenhum estudo comprobatório, os clínicos avaliam que os casos registrados ainda se tratam de “especulação”.
Estudos
Estudos científicos comprovaram que os produtos químicos que compõem os agrotóxicos podem causar males à saúde humana, desde simples alergia a fortes distúrbios neurológicos. Conforme a coordenadora do Laboratório de Toxicologia da Universidade de Brasília (UnB), professora Eloísa Caldas, referência no assunto, existem mais de 400 pesticidas permitidos para uso e bactérias diferentes que causam efeitos diversos para a saúde. O problema é a difícil identificação das doenças ocasionadas.
“É um mal silencioso”, afirmou a professora Raquel Rigotto, do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), quando de um seminário na cidade de Limoeiro do Norte para discutir a contaminação das famílias pelos agrotóxicos de fazendas próximas às residências.
Intoxicações
Conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS) ocorrem cerca de três milhões de intoxicações agudas por agrotóxico a cada ano no mundo, com aproximadamente 220 mil mortes. Alguns casos só são descobertos em estágio avançado das doenças. Os principais efeitos crônicos à saúde são alterações neurocomportamentais, depressão, neuropatias periféricas, dermatoses, alergias, pneumonites, fibrose pulmonar, hepatopatia, insuficiência renal, depressão imunológica, catarata, conjuntivite, desregulação hormonal, redução da fertilidade e câncer.
A professora Raquel Rigotto esclarece para o perigo da utilização dos coquetéis de agrotóxicos. Vários produtos químicos que, para apresentarem maior eficácia, são misturados de forma tanto laboratorial quanto informal.
O mal está nos diferentes períodos de carência para nova aplicação do produto. “Cada composto tem um período entre uma utilização e outra, quando vários estão juntos e são depositados com a mesma carência, há o risco de superexposição dos alimentos a alguns produtos”, comenta ela.
Especialistas acreditam que essa é uma das respostas para o excesso da substância metamidofós nos alimentos analisados na última pesquisa nacional realizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária em 16 Estados. (MJ)
SAIBA MAIS
Casos
A organização Mundial de Saúde estima que 40 mil casos de câncer são causados por agrotóxicos a cada ano. A Agência Internacional de Tratamento do Câncer afirma que são difíceis os estudos sobre os efeitos de produtos suspeitos de serem carcinogênicos para o homem, particularmente quando baixos níveis de exposição estão envolvidos. A avaliação dos riscos de agrotóxicos pelos órgãos competentes é feita baseada em estudos em homens adultos, não levando em consideração a vulnerabilidade das crianças.
Essencial
Lavar bem os alimentos com água e sabão é essencial para reduzir os níveis de toxinas dos vegetais.
SAÚDE EM RISCO
Moradores bebem água contaminada
Limoeiro do Norte. Moradores de comunidades da Chapada do Apodi, neste município, reclamam que, vez por outra, estão bebendo resíduos de agrotóxicos na água que chega às casas. Pelo menos cinco comunidades da localidade são abastecidas com a água de um dos 15 reservatórios do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi, apropriadas, portanto, para o consumo agrícola. O local é o mesmo utilizado pelas máquinas dedetizadoras, que capturam o solvente para misturar aos pesticidas a serem espalhados nas lavouras da área.
O problema parece ter tido início em 2004, quando análises laboratoriais comprovaram que o canal que destina água à localidade de Sítio Tomé e adjacências estava poluída com resíduos agrotóxicos. A situação foi averiguada pelo Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), responsável pela distribuição de água no município. O documento da Câmara Municipal de Limoeiro do Norte, datado de 25 de outubro de 2004, pede que o Ibama “tome providências no sentido de descobrir os responsáveis por tal ato”, relata.
No dia 13 de julho de 2005 o episódio se repete, dessa vez com o flagrante de máquinas de pulverizar algodão sendo abastecida às margens do reservatório de água para consumo das comunidades de Tomé, Cabeço de Santa Cruz, Maçados, Lagoa da Casa, Ipu, Cercado do Meio e Carnaúbas. De acordo com técnicos do SAAE de Limoeiro, o sistema de captação é feito de forma segura no reservatório, e assim que sai de lá a água ainda passa por processos de filtragem e colocação de cloro. Ainda assim, tem morador que só utiliza a água para tomar banho, preferindo comprar água mineral no Centro da cidade.
O presidente da Federação das Associações do Perímetro Irrigado Jaguaribe Apodi (Fapija), Raimundo César, reconhece que a água de todos os reservatórios do perímetro são destinadas para o agronegócio e não estão apropriadas ao consumo humano. O tratamento da água destinada aos moradores é de total responsabilidade do SAAE.
A dona-de-casa Maria Iraci desconfia da água que bebe. Tem medo de pegar doenças. Segundo o líder comunitário do Sítio Tomé, José Maria Filho, no primeiro caso de contaminação do reservatório, foram encontradas várias embalagens de agrotóxicos jogados nas águas. A poluição só ficou evidente porque todos os peixes boiavam mortos. Crianças que pescavam no local, porque não puderam consumir os peixes envenenados que levaram para casa, jogaram para as galinhas e porcos, que morreram em poucos dias. (MJ)
Mais informações:
Departamento de Saúde Comunitária da Universidade Federal do Ceará (UFC), em Fortaleza(85) 3066.8044
Informações: Diário do Nordeste
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