sábado, 5 de junho de 2010

Assoreamento e erosão degradam rios no Estado

Rio Jaguaribe sofre com uma série de agressões ambientais. Com o desmatamento da mata ciliar que deveria proteger as encostas do fluxo hídrico, o assoreamento compromete o lugar (Foto). Em diferentes municípios do Interior, os sinais da falta de respeito aos recursos naturais é uma evidência crescente.
O rio está assoreado. Quais? Não existe nenhum rio no Ceará que não sofra de assoreamento. O que muda é o nível de degradação. Rios como o Jaguaribe e o Banabuiú, os maiores e que abastecem mais da metade do Estado, sofrem de assoreamento, erosão das margens e poluição das águas.
É o homem quem causa, também é quem sofre as consequências quando chove pouco ou se chove muito.
O rio cheio sem "fundura" se espalha pelos lados, consome as casas. É também neste sábado que os municípios do Interior, principalmente os que estão "em desenvolvimento", presenciam a verdadeira procissão de carros de som, em altíssimo volume, anunciando lojas e festas. Perto, ninguém consegue conversar. Em frente à Academia Limoeirense de Letras, cartazes de festas escondem parte do secular patrimônio arquitetônico. Erros de ortografia e ambientais. Tudo é poluição.
Nos 184 municípios do Estado do Ceará existem 236 grandes depósitos de lixo a céu aberto, os populares lixões. Tem de tudo muito: resto de comidas, material de construção, papéis, móveis, animais mortos e lixo hospitalar. Teoricamente, a caçamba despeja em espaços diferentes, mas na realidade é tudo uma coisa só. E quando a massa suja e fedorenta se decompõe dá origem ao chorume, líquido negro e viscoso que penetra no solo e, quando atinge o lençol freático contamina a água potável que tem contato direto com os rios. O Interior só conta com um aterro sanitário, este em Caucaia. Outros dois estão em fase de execução, na região do Cariri e no Complexo Trairi-Paraipaba-Paracuru. Alguns consórcios intermunicipais para construir aterros continuam no papel, e o papel nas gavetas dos gabinetes municipais.
Paradoxo
Nos espaços públicos e privados de vários municípios brasileiros, inclusive do Ceará, uma realidade paradoxal. Uma fila colorida de diversos baldes, para depósito de lixo orgânico, metais, papeis e vidros. Tudo vira um bolo só quando passa o carro da limpeza pública. É o que acontece em cidades como Tabuleiro do Norte e Quixeré. A menos que um catador atento recolha o material reciclável na própria origem, a chamada "conscientização ambiental" não tem passado de "romantismo ecológico", traduzido em preocupação sem atitude.
Em Limoeiro, um conjunto de mais de 100 mudas de árvores nativas na beira do Rio Jaguaribe foi plantado por estudantes e militantes de órgãos ambientais - até mesmo o Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, plantou uma árvore. Hoje, menos da metade continua lá, resistindo às agressões.
Nas prateleiras da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos, unidade descentralizada e principal instituição de ensino superior do Vale do Jaguaribe, diversas apostilas e livros trazem um recorte científico da realidade ambiental da região. Com as polêmicas envolvendo doenças e mortes por contaminação de venenos que agridem o meio ambiente, estudantes universitários, outros secundaristas e mesmo as crianças estão ocupando os espaços das bibliotecas para saber o que está acontecendo na região em que vivem, o que não está dito em seus livros didáticos.
Ocupação irregular
O grande impasse dos governos é conciliar desenvolvimento econômico com sustentabilidade. As comunidades dos litorais leste e oeste vivem do turismo, mas é esse mesmo setor que tem gerado reclamações de quem vê e sofre com a ocupação desordenada, irregular e predatória. Em Canoa Quebrada, pousada invade a falésia (construída há milhões de anos), toma o espaço dos moradores nativos, que antes viviam da pesca, mas pretende empregar esses mesmos moradores em serviços gerais para os turistas que chegam.
A dona-de-casa cuida dos quartos da pousada, o marido ex-pescador vira bugueiro, competindo o território com aventureiros a toda velocidade em seus carros 4x4. A falta de conhecimento da área tem causado acidentes. E no mar de Icapuí, centenas de pescadores olham para o horizonte, prontos para pegarem nas armas e combater os predadores humanos que estão acabando com a lagosta, poluindo o meio ambiente.
É a chamada "guerra da lagosta" que, reiniciada a pesca após o período de defeso, ameaça vidas e desafia as autoridades ambientais no Estado.
COMDEMAS
87,5 por cento dos municípios cearenses possuem Conselhos de Defesa do Meio Ambiente (Comdemas). Este crescimento, porém, não verifica-se com as secretarias municipais do setor.
SEM MONITORAMENTO
Faltam órgãos para disciplinar setor
Todas as ações de políticas públicas em qualquer município refletem, direta ou indiretamente, no meio ambiente que, reunindo os múltiplos conceitos, pode ser resumido como "o espaço que rodeia e influencia todos os seres vivos e as coisas em geral".
Seguindo a realidade do resto do País, muitos municípios cearenses não possuem órgãos específicos para tratarem das questões ambientais. Muitas secretarias municipais e grupos de conselho da sociedade civil aglutinam uma série de outras finalidades e responsabilidades e os recursos ambientais são tratados como preocupação menor. Em função de conquistar o Selo Verde, aumenta o número de conselhos municipais.
A falta de um órgão ambiental de ação permanente favorece a existência de atividades pontuais, como as que ocorrem hoje, Dia Mundial do Meio Ambiente, em várias cidades do Ceará. Preservação, reciclagem, limpeza, plantio e cuidados sintetizam a missão da educação ambiental, geralmente encampada pelas escolas.
De acordo com o Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente (Conpam), existem 161 municípios cearenses que criaram o Conselho de Defesa do Meio Ambiente (Comdema), dez a mais do que no ano passado. Em termos percentuais, o Ceará é o 1º, no Brasil, na cobertura de cidades com conselhos ambientais.
A criação desses órgãos ocorre, geralmente, no primeiro semestre de cada ano, mas não é coincidência: é preciso ter Comdema para que o município possa concorrer ao Selo Verde, visto como troféu pelos gestores municipais. "Ter o Selo Verde dá a entender que o município é um grande preservador do Meio Ambiente, mas não é bem assim", afirma Tércio Vellardi, ambientalista da ONG Recicriança, em Aracati.
É com o relatório de ações educacionais como as desenvolvidas pelo grupo para sustentação do meio ambiente que a Prefeitura Municipal de Aracati enumera as ações públicas em favor do Meio Ambiente.
Em detrimento da realidade de degradação ambiental nas faixas litorâneas e com os cultivos contaminantes de carcinicultura, a Prefeitura foi agraciada duas vezes seguidas com o Selo Verde.
Principal ponto turístico do município, as falésias da Praia de Canoa Quebrada, que levaram milhões de anos para serem construídas, estão em processo contínuo de destruição, conforme série de reportagens já veiculadas no Caderno Regional. A área é de responsabilidade do Município e a regulamentação de ocupação dos espaços deve ser fiscalizada também pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace).
Ao contrário do crescimento do número de Condemas, poucas são as secretarias municipais do meio ambiente, ou equivalentes. Um exemplo é a Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de São Benedito, município da zona norte do Estado. Na região jaguaribana, existe a Autarquia Municipal do Meio Ambiente de Limoeiro do Norte, órgão ainda pequeno e, pelo menos por enquanto, mais voltado para as discussões ambientais do que em ações práticas.
No fim do mês de maio foi aprovado, na Câmara Municipal de Limoeiro, o projeto de políticas públicas ambientais, um manual que norteará as ações municipais no meio ambiente. A aprovação foi pouco conhecida porque é justamente em um de seus artigos que está a permissão para a prática da pulverização aérea de agrotóxicos na Chapada do Apodi. Caberá à autarquia, que não tem fiscais, a atividade de fiscalização.
Os municípios mais informados e atentos só tem até o dia 11 de junho, próxima sexta-feira, para enviar projetos que concorrem à segunda edição do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2). Os projetos de ordem ambiental devem ser destinados a empreendimentos na área de saneamento. A seleção é feita pelo Ministério do Meio Ambiente, via Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano. As informações podem ser obtidas no Ministério com Davi Navarro, pelo e-mail: davi.navarro@cidades.gov.br.
Municípios e sociedade civil mais organizados em ações ambientais podem partir na frente quando em financiamentos de programas e projetos em favor dos recursos naturais. O desafio é manter uma organização permanente, mesmo diante da mudança de governos.
Informações: Diário do Nordeste / Reportagem e Foto: Melquíades Júnior

Nenhum comentário: