sábado, 4 de dezembro de 2010

Zé Maria do Tomé: Audiência decepciona público

Pequeno público e nenhuma novidade sobre a autoria do crime do líder José Maria marcam audiência em Limoeiro do Norte. Representantes do Executivo e do Judiciário não comparecerem.
Decepção - mas esperança - foi o sentimento da maior audiência já realizada para discutir os conflitos agrários na Chapada do Apodi e o assassinato do líder comunitário José Maria Filho. O presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, desembargador Gercino José, e representantes da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, da Presidência da República, ouviram moradores, militantes sociais, pesquisadores, mas a maior parte das autoridades municipais e estaduais convidadas não atendeu ao convite para a audiência.
Não havia mais de 60 pessoas, onde eram esperadas centenas. Emocionados, os familiares de "Zé Maria do Tomé" ouviram da Polícia Civil Agrária do Ceará que em quase oito meses de investigação não se chegou à autoria do crime.
Maior pela relevância judicial, mas estranhamente vazia. Muito embora a presença do ouvidor agrário nacional, desembargador Gercino José da Silva, a maioria dos órgãos públicos do Executivo e do Judiciário não estiveram presentes. A audiência começou próximo de meio-dia de ontem no auditório da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos. Além do ouvidor nacional, participaram da mesa Aílson Silveira Machado, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Cláudio Rodrigues Braga, da presidência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e o delegado de Polícia Civil Agrária do Ceará, Jocel Dantas.
"Lamento informar que não chegamos à autoria do crime. Fizemos todas as diligências, buscas, apreensões, só não foi concluído o exame de balística para identificar o lote das cápsulas, porque o único equipamento que a Polícia tem para isso está danificado", reconheceu, Jocel Dantas, delegado civil agrário responsável pela investigação.
Em mais de sete meses foram ouvidas mais de 30 pessoas, realizadas quebras de sigilos fiscal, bancário e telefônico, inclusive requeridos novos depoimentos após constatar divergência de versões dos ouvidos, mas é só. O assassinato que causou comoção nacional e repercussão internacional não deixou punidos e nem mesmo exame de balística foi averiguado.
Moradora Socorro Guimarães depõe em audiência para Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo. Representantes do Executivo e do Judiciário não comparecerem.
A viúva Lucinda Xavier, a "dona Branquinha", acompanhava, desolada, a reunião. "Vamos ver no que vai dar, né?". A moradora Socorro Guimarães, também da localidade de Tomé, foi a primeira a falar para o desembargador Gercino. "Zé Maria lutava por nós. A questão da água causando doença levou ele muitas vezes a procurar as autoridades. Não fizeram nada".
Socorro falou em nome da comunidade, após uma época em que só José Maria "tinha coragem". Sem o líder, outros moradores, notadamente as mulheres, têm assumido participação na luta que não acabou, visto todos os problemas denunciados pelo líder assassinado serem recorrentes na região.
O pároco Júnior Aquino, da Diocese de Limoeiro, pediu a investigação pela Polícia Federal, "mas é importante que a Justiça Federal também compareça, dê o seu apoio". O religioso relembrou os momentos de luta encabeçados por José Maria Filho, este que em vida acompanhou um levantamento de iniciativa dos próprios moradores da Chapada do Apodi: numa pesquisa espontânea, visitaram 80 casas da comunidade e, em 15 delas constataram ao menos um residente com câncer. Afora o levantamento popular é a própria Secretaria Estadual de Saúde que reconhece o alto número de óbitos por câncer em cidades como Limoeiro do Norte - média de uma morte pela doença a cada nove dias em 2009.
Pistolagem
"Qual a garantia de que essa reunião vai dar em alguma coisa? Nós estamos numa região em que o crime de pistolagem é uma marca. Os moradores do Tomé não falam publicamente com medo. Zé Maria foi morto três vezes: quando foi assassinado, quando um mês depois a Câmara Municipal de Limoeiro voltou a admitir a pulverização aérea e agora, quando oito meses depois a Polícia não tem nada a apresentar, nem ao menos um exame de balística", reclamou João Alfredo Telles, especialista em direito ambiental e vereador de Fortaleza.
Os líderes presentes reclamaram da pouca divulgação do evento, o que inviabilizou a presença de várias instituições, inclusive a Universidade Federal do Ceará, que detém a maior pesquisa já feita sobre os impactos dos agrotóxico na saúde da população do Apodi.
Conflitos
63 pessoas morrem anualmente no Brasil por conflitos no campo, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), comissão ligada à Presidência da República, que acompanha os casos.
Informações: Diário do Nordeste / Reportagem e Foto: Melquíades Júnior

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