segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Cogerh mapeia potencial hídrico do Estado e avalia o uso de agrotóxicos na Chapada do Apodi

Levantamento pioneiro da Cogerh mede a quantidade e a qualidade da água no subsolo do Estado.
De toda a água doce existente no planeta, 96% corresponde às águas subterrâneas. E além dos recursos hídricos na superfície, o Ceará possui um potencial ainda inestimável de recursos hídricos no subsolo, constituídos em aquíferos. Levantamento pioneiro da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) começa a mensurar a quantidade e a qualidade da água abaixo dos nossos pés. Comissões com representantes de Ceará e Rio Grande do Norte farão o gerenciamento das águas subterrâneas da Bacia Potiguar, entre os dois Estados.
O gerenciamento é mesmo para ter um controle do manuseio das águas subterrâneas, tão utilizadas para consumo doméstico nas comunidades rurais do Interior como para a agricultura irrigada, visto ser a Chapada do Apodi o maior polo fruticultor do Estado, e nela concentra-se a maior área irrigada com água subterrânea no Estado, principalmente no município de Quixeré. Os técnicos da Cogerh passaram dois anos visitando poços nos municípios de Alto Santo, Aracati, Icapuí, Jaguaruana, Limoeiro, Quixeré e também em Tabuleiro do Norte.
Agricultora Maria de Fátima retira água de um dos locais de estudo da Cogerh, em Limoeiro do Norte.
Ao todo, foram cadastrados 784 poços em uma área que compreende cerca de 8% da bacia hidrográfica, desde poços rasos, cacimbas a poços tubulares. O foco do estudo foi o sistema aquífero de formação Jandaíra, composta por calcários esbranquiçados e homogêneos. Apresenta espessura de 50 a 250 metros, de fácil exploração por poços tubulares, e também os mais fáceis de serem contaminados.
Outras formações são Açu, com água mais profunda (até mil metros de profundidade) e de melhor qualidade, e barreira, formado por arenitos argilosos e que ocorre ao longo do litoral brasileiro.
"Temos que mudar a cultura de que só se deve preocupar com a água superficial, mas também a subterrânea", afirma João Lúcio, diretor de planejamento da Cogerh. A região do Apodi foi escolhida para o Estudo pelo grande potencial econômico gerado pelas águas subterrâneas na região do perímetro irrigado Jaguaribe Apodi, em Limoeiro do Norte e Quixeré. Estima-se que as águas subterrâneas são diretamente responsáveis pela irrigação de 10 mil hectares de plantio - as águas superficiais dos rios e dos açudes irrigam cerca de 75 mil hectares de terra.
A meta da Cogerh é instalar 40 estações de análise para o tratamento e gerenciamento da água. Em miúdos, monitorar para evitar a escassez e a poluição. O trabalho será feito em parceria com os próprios usuários, notadamente famílias da zona rural que utilizam os poços para consumo doméstico e na plantação. O projeto "Plano de Gestão Participativa dos Aquíferos da Bacia Potiguar Estado do Ceará" foi apresentado em Limoeiro do Norte, na última sexta-feira (06/11), por Zulene Almada, coordenadora técnica do levantamento, em parceria com a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh).
O trabalho engloba cadastro de poços, hidroquímica, isótopos ambientais e bacteriologia, implantação de estações de monitoramento por datalogger, levantamento planialtimétrico, avaliação das dimensões de contorno dos aquíferos, balanço hídrico e estimativa de recargas e reservas e mobilização social. Afinal, são os sertanejos do campo os proprietários dos poços.
"As estações de tratamento do passado não contam. Temos que gerenciar a quantidade, e cada vez mais a qualidade da água que fornecemos. Esse é o grande desafio do Estado do Ceará e do Brasil", colocou Francisco Teixeira, presidente da Cogerh, durante a apresentação do projeto. Além do levantamento da quantidade e qualidade das águas subterrâneas, o estudo constatou que a água usada para consumo doméstico via poço artesiano pelas comunidades da Chapada do Apodi é imprópria. O auto teor de calcário torna-se prejudicial.
ESTUDO
Uso do agrotóxico também é avaliado
Limoeiro do Norte. O levantamento realizado pela Cogerh traz mais uma evidência científica de um problema que há vários anos tem preocupado a população jaguaribana: o impacto do uso de agrotóxicos na lavoura e no homem. A análise laboratorial das águas extraídas dos poços subterrâneos constatou a presença de metais pesados, coliformes fecais e de produtos químicos usados para o combate a pragas na lavoura, ou seja, muito veneno.
Apesar de estarem nos níveis "aceitáveis" pelo Ministério da Saúde, a revelação é reverberada pelos movimentos sociais, por pesquisadores e pela própria Companhia, que reconhece a necessidade de uma gestão participativa integrada dos aquíferos do Ceará.
Zulene Almada, coordenadora técnica da Cogerh, durante apresentação da pesquisa sobre águas subterrâneas.
O Laboratório de Análise de Resíduos de Agrotóxicos (Labtox) do Instituto de Tecnologia de Pernambuco (Itep) constatou a presença das substâncias como diazinona, ametrina, flutriafol, propiconazol e ciromazina em diversos poços subterrâneos cujas águas são usadas para irrigação, mas também consumo doméstico. Essas substâncias compõem o princípio ativo dos venenos usados na lavoura da região e escoam para o aquífero Jandaíra, que compreende o Ceará e o Rio Grande do Norte.
Os agrotóxicos encontrados na pesquisa possuem solubilidade de moderada a alta na água. "Esse estudo traz muitas evidências. Apesar de existirem valores mínimos de venenos, eles existem, e infelizmente a nossa legislação tem legalizado a poluição da água", afirma Alice Pequeno, do Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a Sustentabilidade (Tramas) da Universidade Federal do Ceará (UFC). Nos anos de 1977, 1990 e 2004 a legislação brasileira aumentou de 12 para 13 e, depois, 28, respectivamente, o número de agrotóxicos de permitida constatação nos recursos hídricos. E o Laboratório de Hidroquímica do Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará (UFC) diagnosticou a presença de metais como bário, chumbo, cádmio retirados também dos poços de águas subterrâneas.
RESERVAS
Poços ajudam agricultores
Limoeiro do Norte. Para quem não pode esperar somente por chuva nem mesmo por tanta água armazenada nos reservatórios públicos, a água vem de muito baixo, quando a luz no fim do túnel é, na realidade, um buraco escuro que se jogar um balde ele volta pesado, e encharcado. Na casa da agricultora Maria de Fátima Lima da Silva, na comunidade limoeirense de Córrego de Areia, a água de dois poços serve para alimentar em casa e nas plantações de limão e coco.
O poço existe há muitos anos, "desde sempre", que ela não soube precisar a "fundura". A água é puxada com uma bomba manual. E no movimento de sobe e desce da alavanca, a água sai bem limpinha pelo cano e cai na bacia de alumínio. "É incrível, né? Um terreno seco desse dar água todo santo dia. Nunca faltou", afirma a agricultora.
Mas a realidade de muitos poços é a escassez em alguns períodos do ano. De acordo com João Lúcio, diretor de planejamento da Cogerh, isso se dá pela falta de controle e planejamento na utilização. "É preciso se observar a carga e a recarga desses reservatórios, para que a demanda não se torne muito maior do que a oferta de água, principalmente numa região como a jaguaribana, em que a água para irrigação é um dos principais instrumentos do desenvolvimento econômico aqui verificado", salienta.
Os poços, que na zona rural são mais chamados de cacimbas ou cacimbões, são qualificados mediante a profundidade, pois é quem determina o método de construção. A cacimba é geralmente construída de forma cilíndrica, revestidos com tijolos ou anéis de cimento. Na casa de dona Maria de Fátima, no Córrego de Areia, um poço é mais raso, para o abastecimento doméstico. Outro, maior e com motor elétrico, alimenta a plantação. Em algumas casas vizinhas, as cisternas armazenam mais da água puxada do poço do que mesmo das chuvas durante o ano.
Informações: Diário do Nordeste / Reportagem e Fotos: Melquíades Júnior

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