domingo, 8 de março de 2009

Histórias renascem com as relações sociais

Mestre da cultura: Louceria Lúcia Pequeno, destaque no cenário cultural de Limoeiro. (Foto: Melquíades Júnior)
A publicação de “Vale do Jaguaribe – histórias e culturas” tem um significado novo na historiografia da região jaguaribana, em que pese a predominância de apanhados de memorialistas em outras publicações.
Dessa vez são 16 trabalhos científicos, ainda que uma condensação de monografias, e mesmo que tais trabalhos ainda pareçam carecer de dados, mais tempo, mais informações em trabalhos que transcendem à pesquisa histórica, almejam a Sociologia, a Antropologia.
Das relações sociais e econômicas entre famílias de artesãos são feitas as comunidades, as histórias. Curiosidades temperam as relações sociais dos atores jaguaribanos, como as famosas louceiras do Córrego de Areia, em Limoeiro, pesquisadas pela professora doutora Francisca Mendes: “Merece destacar que, aos olhos das louceiras, a lagoa (local de extração do barro) é muito mais do que a extensão de uma terra cheia de escavações. Ela revela caminhos por onde as outras passaram, uma vez que identificam quem esteve antes no local, que quantidade de barro levou e quanto tempo faz, a partir dos sinais deixados nas escavações. Algumas louceiras cobrem os lugares escavados para que as outras não percebam que ali tem um barro de boa qualidade”.
Outras curiosidades a se encontrar no livro: “um escravo de nome Tibúrcio, com idade de deseceis annos, cor mulato, filho de uma escrava minha por nome Joaquina... o alforrio... desde já gosar de sua liberdade... somente impondo a condição de me acompanhar até o fim da minha vida...”. É o trecho de uma carta de alforria na Vila do Espírito Santo, em Morada Nova. Vê-se que o documento pouco valia de quebra de algemas na relação senhor-escravo. Um dos pontos a se destacar da publicação são as centenas de referências bibliográficas.
É preciso concordar com o professor e deputado federal Ariosto Holanda, que escreve o prefácio da obra: o livro representa um significado histórico em si, o encurtamento da distância entre a faculdade e os níveis médio e fundamental de ensino, além da oportunidade de olhar o presente tendo como referência o passado. Ainda diz Ariosto que o material “não deixa de ser um tratado antropológico da região”. Mais do que isso, é uma demonstração de que transbordam em potencial para as ciências humanas os pesquisadores da história – com Geografia, Letras e Pedagogia formam os únicos cursos da área de humanas.
Fundação
Com 40 anos da fundação, a Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos, que não tem curso de Filosofia, carece de cursos como Ciências Sociais e Filosofia; e bacharelado, não somente cursos em licenciatura – motivos para fuga de “cérebros” da região, que não querem enveredar pelo trabalho docente. “Este livro nasceu de um desejo, compartilhado com os bolsistas do Programa de Educação Tutorial (PET) do curso de História da Fafidam, de reunir os resultados das pesquisas desenvolvidas por bolsistas no referido programa, as quais resultaram em suas monografias de final de curso de graduação em história”.
E completa: “a motivação era darmos visibilidade ao conhecimento histórico produzido por nossos alunos, de modo que uma gama variada de público pudesse ter acesso a cada uma das pesquisas selecionadas para compor essa coletânea”, explica José Olivenor Sousa Chaves, professor doutor do curso de História e organizador do livro, em parceria com os alunos do curso de História da Fafidam.
SAIBA MAIS
Trechos
A seguir, alguns dos trechos da obra, para situar o leitor nos aspectos abordados no livro:
Farinhada
"Muito importantes até as décadas de 1970, as casas de farinha representam o lugar da memória, o espaço da saudade, embora ainda seja possível se encontrar em funcionamento, pelo Baixo Jaguaribe".
Ocupação
"A ocupação civilizatória no Vale do Jaguaribe teve início no século XVII, em decorrência da criação de gado, a partir de duas rotas de penetração: uma, vinda de Pernambuco pelo baixo curso do Rio Jaguaribe, e outra, procedente da Bahia, vinda pelo alto curso do rio".
Resgate
"Trabalho de amor num terreiro de umbanda em Limoeiro: põe-se em um pirex as fotos das duas pessoas, escreve-se os nomes completos nas velas e as coloca sobre as fotos. Depois é derramado mel dentro do pirex, para inundar de doçura a relação que se pretende levar a efeito. Ao final, borrifa-se perfume".
Fonte: Diário do Nordeste / Reportagem e Foto: Melquíades Júnior

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